Tuesday, February 16, 2010

São todos os erros que há os homens que erram.

É uma derrota que se joga, - nós jogamos à derrota, é esse o nome do nosso jogo - e eu ganho tantas vezes que me chega a parecer que já ando nisto há demasiado tempo.

Friday, January 22, 2010

E onde o tempo é eu não chego; faço que o silêncio me caiba no que devo dizer; e não te digo nada.
Se forem letras
soletro-as em tanto
tempo – chegas; o tempo
pára
e não me chega

como num fim
com fim

Tuesday, November 17, 2009

Das coisas

A verdade é um assertivo esconderijo. Eu por vezes que olho para o presente do passado - isto é, o futuro do que eu deixei -, encontro as pessoas melhor que as que conheci. É fácil de perceber que sou gente de emoções que se chamam overwhelming, o que me impede de, no presente, ver o futuro, e esta é provavelmente a forma mais viciada e verdadeira de se orientar o presente - e a verdade é um coeso esconderijo. Sou um homem que está escondido na verdade, incapaz de ver a realidade, ou, pelo menos, as mulheres.

Sunday, November 08, 2009

No CCB

Há pouco mais de um ano, tinha eu carta há semanas e já pouca paciência para cumprir as regras do parar, passei um vermelho. Era de noite, e achei que já não vinha ninguém. Continuei o percurso, um dos primeiros que aprendi de cor, e reparei que se encostara um carro ao meu lado esquerdo. Uma rapariga abrira o seu vidro e encolhera-se para que o condutor se pudesse aproximar da janela para me falar. Você reparou no que fez? - disse, de voz morna mas com pressão - passou o vermelho. Se eu não tivesse parado, tínhamos chocado. Já viu o que podia ter acontecido? Tenha mais calma daqui para a frente. De volta a mim, que entretanto abrira o vidro enquanto me preparara para negar tudo e ainda o culpar de qualquer coisa que me lembrasse, arrumei as primeiras letras que me saíram e mandei fora as outras. Foi um momento desarmante. Ontem, estava eu na fila da cafetaria do ccb para pedir uma bica, e vi uma mulher com uma beleza desarmante - levei a bica para a esplanada e li uma boa parte do meu Gente Independente do Laxness. Li inclusivamente uma frase que dizia que o Sol brilhava com mais força que o passado. Mas, naquele momento, não tinha como me alhear e culpar (do formigueiro) aquela beleza da sua própria mulher, que não me pôs em risco e não é lasciva, antes eu quase a atropelara com vontade de ler o meu livro sozinho e beber um café. A maioria das pessoas não a acharia assim tão gira, eu não me sinto angustiado de não a ter, ela é desarmantemente bonita.

O político declara que não tem nada a ver com o caso de corrupção que sai nas notícias, e, até prova em contrário, é inocente. Há aqui uma simetria desarmante.

Sunday, November 01, 2009

Das escadas dos desconhecidos

Não se conheciam ainda e combinavam os seus encontros ao final das escadas - escadas que se desenrolavam como nos filmes americanos, e vinham parar aos seus pés. As escadas são uma coincidência, concedo, mas não se conhecerem é uma legítima necessidade. As escadas iam só ao terceiro andar, a partir daí o prédio crescia sozinho até se deixar de ver.

Friday, September 18, 2009

Sou elitista, mas deixaram-me em terra. A olhar para os barcos que já foram, e com medo dos selvagens violentos lá atrás.

Wednesday, September 16, 2009

Eu

Que não via séries, vi as duas temporadas do Rome e quatro de cinco do Lost em um mês. O Lost no fundo é um engodo, mas já estou como um amigo meu em relação ao Mcdonald´s. Desde que me enganem bem, eu deixo – ele referia-se ao método eficiente de orientar as filas de espera, que é tudo científico e tal. Está cheio dos truques que se aprendem na escrita criativa, sem esquecer os defeitos que se aprende a não fazer e que funcionam tão bem. Os twists na história são conseguidos através da constante mudança das regras do jogo. Depois de nos orientar em certo sentido, e de nos deixar construir uma lógica que nos permita dispor as peças, diz que as regras mudaram e estamos em falha. É desonesto e desproporcionado. O pós-modernismo fez a mesma coisa e sem miúdas giras.

Saturday, August 29, 2009

Assorted de sábado à tarde

Eis porque não posso ser intelectual - reside a explicação no seguinte: ouvia eu a radar enquanto ia para s. bento ver uma casa, um t1 pequeno, e ouvi parte do fala com ela onde se entrevistava o herman. Como tive que interromper várias vezes porque não vi só aquela casa, vi outra mesmo na esquina daquela rua que sobe para a escola de belas artes, mais um bébé que nasce e mais um jovem casal que se perde para os subúrbios, assim que cheguei a casa fui ao site da radar ver se já lá estaria a entrevista. Não estava essa mas estava lá uma com o julião sarmento, que ouvi falar pela primeira vez, curiosamente, por causa do herman, porque o artista bastos, aquele personagem do herman enciclopédia, falava muito do julião sarmento. Pus-me a ouvir - aquilo correu-lhe muito mal, o rapazinho foi fintado por uma tal de Inês, que vem das beiras - e há certa altura em que ele diz que o punch drunk love é um dos 10 melhores filmes de sempre e o melhor certamente do PT Anderson. É por tudo isto que eu não posso ser intelectual. Partilho da opinião idiossincrática dos intelectuais, até do timing impróprio para as ter (é possível que agora já muita gente goste do filme, antigamente toda a gente detestava e eu devia ter alguma coisa de errado comigo), e até vejo algumas coisas para intelectuais, mas sempre, sempre, sem querer. O outro encontrava Deus num copo de Whiskey, eu encontro a intelectualidade na tv guia - a sério, há uns tempos encontrei lá uma citação de Sartre em que ele dizia que se devia saber matar o que se ama, e foi assim que conheci Sartre, pena que Sartre seja afinal fosse um pseudo se não hoje seria um homem feito.

O herman é um homem orgulhoso, inquestionado (ele chega a dizer que a Amália não tinha ido para a cama com as amigas lesbicas por crenças religiosas, como se houvesse tal coisa, crenças religiosas), que se acha claramente melhor do que é e que alimenta uma ilusão paranóica sobre a explicação dos seus fracassos, mas é capaz de momentos de Adriano à la Yourcenar. A certa altura refere que o mundo político, as polícias, os tribunais, são como o caçador em relação aos passarinhos. Adoram-nos, há poucas coisas que eles gostem mais, mas como não os conseguem possuir vivos, abatem-nos para os terem perto. Esta frase merece um post.

Wednesday, August 26, 2009

Breathing is just a rythm

A regina spektor tem um novo álbum, e canta a certa altura que breathing is just a rythm. É um ritmo sem refrão, este – o de respirar – mas o outro, o da música, dá-me vísceras à razão. Há alturas em que dou comigo a viver mais depressa, e sempre porque há um ritmo exterior a mim; dou comigo a caminhar mais decididamente numa direcção que desconheço. Mas se respirar é apenas um ritmo, a beleza é falta de ar. Não há ritmo; não há banda, dizia o outro; não há coração. Sem coração nem sequer há tempo, e sem tempo não há por que nos preocuparmos. A beleza é despreocupada. Já a arte tem qualquer coisa do ritmo – que requer tempo, coração – e de belo, porque não nos dá tempo. Tem por isso qualquer coisa de muito cruel.

Tuesday, June 27, 2006

ricos são os sós

Todos os filmes alternativos se baseiam na solidão. Há um personagem que vive num estúdio de paris. Acorda de manhã inundado de luz. Revira-se na cama, mal embrulhado nos lençóis, a espinha em relevo nas costas, muito magras. Disto tudo, o que me oferece maiores dúvidas é a possibilidade de um personagem principal de um filme alternativo, que tem que ser de esquerda e, pior que de esquerda, tem mesmo que ser pobre, alugar um estúdio em paris. Será que alguém sabe quanto custa alugar um estúdio nestas cidades? É um salário médio Português, só em renda. Quem é sofisticado, tem que partilhar casa com pessoal de leste. Não dá para estar sozinho. A pobreza e a solidão são mutuamente exclusivas.

Monday, June 19, 2006

Enterro

As minhas histórias acabam sempre com alguém que morre. Não acabam, mas deviam.

Tuesday, June 13, 2006

Sísifo

Uma das cláusulas mais bem escondidas deste contrato é que trabalhar empobrece. Por mais dinheiro que ganhemos, não recuperamos a capacidade de estremecermos nas duas pontas de um relacionamento amoroso: no começo e no fim. A alegria e a tristeza concentram-se, amassam-se, cabem dentro de uma mão e atiram-se para longe porque precisamos de parecer bem. E ficamos bem. Dizem que não, que isto é tudo parte do crescimento, porque se recusam a ponderar o tanto que perdemos - é inimaginável. O silêncio dos labirintos, a luz numa clarabóia de um prédio abandonado em Lisboa, as seis da tarde (a luz desaparece devagarinho, mas ainda não é noite). Nunca mais.

O pior é que, por mais anos que trabalhemos, não conseguimos pagar os anos que trabalhamos.

Thursday, June 01, 2006

um apontamento

Como já não sei escrever, podia ler. Como já não sei ler, penso.

E olho. Olho aquilo que não consigo ver. Mantenho os olhos invisíveis.

Wednesday, May 03, 2006

Imagem

Eu acredito que a banda perfeita deveria ter pelo menos dois clips por música. Essa é a única forma de reduzir a imagem à sua verdadeira insignificância, fotocopiável, e de exaltar a música como perene. Um clip por música cria a falsa ideia que a música é classificável com um conjunto fixo de imagens, como se pudesse ter apenas uma visão ou uma interpretação.

Curioso que a melhor banda de sempre, os Suede, tivessem os piores clips.